Pedro e Susan embarcam no avião para o Brasil, depois de certa dificuldade para encontrarem uma linha aérea disponível. No voo, não podiam de deixar de ouvir as notícias que escutaram no saguão de embarque. Pareciam ecos aterrorizantes: casas faltando parentes, comércio fechado em dia normal, carros desgovernados sem motorista, aviões sem pilotos...
Tudo aquilo os aterrorizava tremendamente, principalmente porque se dava em um momento que ninguém esperava, pois o mundo passa por um tempo de prosperidade e desenvolvimento nunca dantes experimentados. Ambos, por serem tão materialistas, estavam estarrecidos diante de tal cenário caótico. Dois céticos sem saber o que esperar daqui para frente.
Durante o voo, nem Pedro nem Susan pregam os olhos. O avião pousa no aeroporto Santos Dumont, no Rio de Janeiro. Abalados, os colegas não trocam muitas palavras, enquanto se dirigem para a saída e tomam um taxi.
Pedro se oferece para ir deixar sua colega em casa. Aqui no Brasil, Susan divide apartamento com uma prima sua, sobrinha de sua mãe. Sua prima, Safira, é evangélica desde criança. Quando chegam ao apartamento, encontram-no fechado. Susan pergunta a um vizinho que passa por ali se ele sabe de Safira. O rapaz diz que ela havia saído há algumas horas, transtornada, aos prantos, dizendo que tinha de ir à igreja.
Os dois resolvem ir ao templo da igreja que Safira freqüentava. No caminho, eles testemunham um cenário de caos total: lojas sendo saqueadas, pessoas chorando por entes desaparecidos, policiais tendo de usar a força para conter os mais exaltados, engarrafamentos provocados por acidentes envolvendo carros sem seus condutores (as mesmas notícias que eles tinham ouvido quando estavam em Nova Iorque). Por conta do trânsito que mal avançava, eles demoram a chegar ao templo.
Ao chegar lá, encontram, de fato, Safira, mas também um cenário estarrecedor: havia algumas horas, os crentes daquela igreja estavam em um dos cultos, restando agora roupas e pertences sobre os bancos, no chão, levando à dedução de que sumiram não levando nada. No templo também havia algumas pessoas chorando, se lamentando, indagando por que não haviam subido com os demais cristãos. Alguns de joelhos, chorando feito crianças sem consolo.
Safira, ao ver sua prima, começa a chorar, sobretudo envergonhada, pois naquele momento um flashback passa em sua mente: muitas vezes que ela falava para Susan voltar para a igreja, para ser fiel a Deus e à Sua Palavra. E agora, aquela crente que aconselhava tanto sua prima afastada do Evangelho, se encontrava ali.
Susan vai ao encontro da prima.
- Ah! Prima - lamenta Safira -, tanto que falei para você vir para igreja, e olhe onde estou... Aqui, chorando por ter ficado!
- Safira, não é hora de lamentar, porque sabemos o motivo de não termos ido com eles - consola Susan sua prima. Agora é hora de saber o que vamos fazer...
Susan quase é interrompida pelos gritos de um homem no altar:
- Por que, meu Deus?! Por quê?! Eu profetizava, expulsava demônios, falava em línguas estranhas, interpretava, tinha tantos dons, mas eu fiquei! Me diga por quê?!
Safira, reconhecendo o autor desse murmúrio, se dirige até o homem e o interpela:
- Irmão Jonas? É o irmão Jonas, não é?
Ele confirma que sim e ela continua:
- Eu o conheço! Você muitas vezes pregava aqui e víamos Deus agir poderosamente. O que houve, irmão? Por que você ficou?
- Ah! Irmã, realmente era muito usado, mas quando saía da igreja, só Deus e eu sabíamos o que eu aprontava - diz o homem com ar de pesar. Eu me prostituí muito. Muito do que falava na igreja era da carne, não tinha nada de Deus. Mas havia muitos irmãos usados por Deus que me repreendiam e falavam para eu me converter. Oh! Deus, por que fui tão insensato?!
Enquanto acontece aquele diálogo, outro homem se aproxima e começa a se lamentar também:
- Eu sei bem do que fala o irmão Jonas. Quantos cultos eu não fingi ser tomado por Deus e transmiti a muitos crentes somente o que eles queriam ouvir: palavras de vitória, bênçãos, curas... Tudo eu que falava e não Deus! Muitos irmãos não caíram nesse laço, principalmente aqueles que vinham sempre aos cultos de doutrina, para a escola bíblica!
E os relatos eram todos parecidos: pessoas que viviam de aparências, que freqüentavam os cultos somente com interesse de algo em troca, pessoas que se diziam espirituais, mas que não o eram na realidade, outros que não davam ouvidos à voz e conselhos do pastor, pessoas que rejeitaram a palavra de Deus.
Naquele momento, um homem em prantos entrou no templo, gritando:
- Senhor! Senhor! Me perdoe! Eu estive por tanto tempo na Tua Casa, contemplei tantos milagres, presenciei tantas curas, mas nunca dei ouvidos realmente à Tua voz. Achava que tudo era fingimento, que era emocionalismo, que os teus filhos eram alienados. Andei sempre pelo que dizia meu coração, e acabei onde estou... Senhor, tem misericórdia de mim!!!
Aquele homem era apenas um dos vários que ali se encontravam tristes e desesperados por não terem sido cristãos verdadeiros e agora estavam arrependidos...
FIM
Por Valdemir Alves
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